Estou mais preocupada com salário das mulheres do que com temor reputacional de empresas, diz coordenadora de relatório

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Em meio à disputa travada na Justiça por algumas empresas contra a divulgação do relatório de transparência salarial, a subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Paula Montagner, se diz mais sensibilizada com o rendimento das mulheres do que com o temor das companhias de dano à reputação.

“Muito se fala na questão reputacional, mas eu estou mais preocupada com o salário das mulheres. A reputação das empresas deveria ser de construir uma igualdade”, diz a coordenadora do levantamento, que mostrou que mulheres ganham, em média, 19,4% a menos do que homens no Brasil.

Com o prazo para divulgação do relatório encerrado em março, os fiscais do Ministério do Trabalho agora vão checar se as informações foram efetivamente publicadas pelas empresas. Em caso de descumprimento da determinação prevista em lei, será aplicada uma multa de 3% da folha de pagamento do empregador, limitado a 100 salários mínimos.

À Folha de S.Paulo, Montagner afirma que a fiscalização “não é multa de trânsito” e que o objetivo da pasta é dar visibilidade a uma situação de desigualdade no mercado de trabalho que está “entranhada culturalmente”.

O relatório trouxe um diagnóstico sobre desigualdade de gênero no trabalho já conhecido há bastante tempo. Qual é o principal avanço?

A gente tem que separar o que é novo do que não é. O que não é novo: o conhecimento do rendimento médio, do rendimento mediano, do rendimento por ocupações. Mas nunca houve informações relativas a critérios remuneratórios nem a políticas pró-diversidade e de ação de promoção da parentalidade. Também é novo: um relatório por estabelecimento.

São quase 50 mil empresas com 100 empregados ou mais, 17,7 milhões de empregados, encontrando um resultado similar àquele que a PNAD mostra para o conjunto dos empregados do Brasil. É uma revelação de como a situação de desigualdade está entranhada culturalmente. A empresa tenta falar que tem empregados diferenciados. Estou dizendo que para ocupação igual, que faz trabalho igual, tem que ter salário igual. É difícil porque são mentalidades diferentes.

Estamos tentando uma transformação cultural importante em que a gente garanta que o salário de partida, de contratação seja igual. O salário de contratação também é 14,6% menor para mulheres. Se elas já partem com salário menor é mais difícil de corrigir [a desigualdade] no futuro. Agora é trabalhar para que as condições de trabalho sejam iguais.

PERGUNTA – A principal crítica das empresas é que foram desconsiderados critérios como senioridade e tempo de empresa na média salarial. Qual é sua visão?

PAULA MONTAGNER – Tenho que produzir um relatório com base nas informações que as empresas me oferecem. Embora a gente ouvisse dizer que a empresa adota tempo de casa como um critério para remuneração, nós não temos essa informação discriminada na folha de pagamento, pelo menos para a maioria das empresas. O setor público, por exemplo, tem essa tradição.

P. – As empresas sempre dizem: os homens têm mais tempo de casa. Verdade. Porque, toda vez que tem uma crise econômica, quem é demitido mais rapidamente?

PM – Jovens e mulheres. Se você não incorpora na discussão que mulheres são chefes de domicílio também e que, portanto, não podem simplesmente ser retiradas da folha de pagamento, a gente não vai a lugar nenhum. A gente precisa, de fato, garantir que mulheres não vão ser maioria entre os funcionários demitidos. Na pandemia, as mulheres foram as que mais perderam postos de trabalho e por quê? Porque tinham que cuidar da casa. Os homens não? Essa situação, embora espelhe uma realidade, também espelha uma discriminação. É com isso que a gente precisa lidar.

Se a gente passar a ter discriminados os valores que são pagos para homens e mulheres como adicional por tempo de serviço, não tenho problema de incorporar essa diferença, mas preciso que ela esteja explícita. Esse é o primeiro relatório. A gente quis garantir que todas as empresas fossem tratadas de forma isonômica a partir dos dados que elas nos enviaram. Conforme a gente vai avançando, nosso interesse é melhorar as situações e garantir que a gente passe a incorporar indicadores melhores. Se a gente começar a ver que mais informações detalhadas são oferecidas, fico muito feliz de incorporar isso.

P. – A questão reputacional é uma das preocupações das empresas. Como enxerga isso?

PM – Muito se fala na questão reputacional, mas eu estou mais preocupada com o salário das mulheres. A reputação das empresas deveria ser de construir uma igualdade. A gente quer um país mais igual. Não vai acontecer de estalo, a gente vai ter que fazer isso com método, com plano, com transparência. A gente talvez precise de mais detalhamentos, mas isso está aberto para construção no segundo, terceiro relatório, para a gente ir ganhando familiaridade com os problemas e ir aprendendo a trabalhar essas informações.

P. – Como vai ser a fiscalização?

PM – Será feita pelos fiscais do trabalho. Não é multa de trânsito. ‘Encontrei você numa infração, passei uma multa, tchau.’ A discussão envolve primeiro ver se fez a divulgação do relatório.

P. – O objetivo do ministério não é multar, é que seja publicizado?

PM – É que seja publicizado. Mas o ministro [Luiz Marinho] também disse que não pode prevaricar. Como existe a multa, o que nós vamos fazer? Verificar a publicação. Não estou abrindo para as pessoas fazerem em abril, não, já deviam ter feito isso em março. Se por algum motivo não fez, coloca uma notinha: não pudemos divulgar porque tivemos um problema operacional. A gente acha que o importante é caminhar nessa discussão.

Por exemplo, as empresas de Minas [Gerais] pediram prazo adicional porque o TRF-3 [Tribunal Regional Federal da 3ª Região] derrubou a liminar de não-divulgação perto do fim do prazo. Nesse caso, a ideia é que divulguem o mais rapidamente possível porque a primeira fase é multar quem não divulgou.

Depois disso é avaliar as diferenças e se essas diferenças têm explicação ou não. Se a explicação da empresa estiver correta, ela está liberada. Se não estiver liberada, ela tem que fazer um plano de mitigação. Ela tem a chance de fazer algo que até agora não existia, que é um plano que ela vai trabalhar com seus trabalhadores, trabalhadoras e sindicatos para corrigir aspectos que não estejam garantindo a equidade.

P. – Como está a questão da judicialização?

PM – A gente é acusado de fazer coisa que não fez: divulgar dado que a LGPD proíbe, não fizemos. Divulgar informações individualizadas, não fizemos. São 20 anos de estudos que olharam dados para dizer que isso é uma discriminação. A gente chamou a atenção dos juízes de que isto que a gente está vendo não é algo que a gente criou.

RAIO-X

Paula Montagner, 65

É subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego. Possui graduação em Economia e Filosofia, ambas pela USP (Universidade de São Paulo) e mestrado em Economia pela Unicamp (Universidade de Campinas). Antes de trabalhar no MTE, foi secretária adjunta de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do Desenvolvimento Social entre 2011 e 2016.

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